As crianças podem assistir ou participar em touradas?

As crianças podem assistir a touradas?

Infância sem violência
Campanha Infância sem Violência.

A legislação nacional (Decreto-Lei n.º 90/2019 de 5 de julho) classifica o espetáculo tauromáquica para “maiores de 12 anos” (Artigo 27º – Classificações especiais):

1 – Salvo parecer em contrário da comissão de classificação, são classificados:
a) Para maiores de 3 anos, os espetáculos de circo;
b) Para maiores de 6 anos, espetáculos de música, de dança, desportivos e similares;
c) Para maiores de 12 anos, os espetáculos tauromáquicos;
d) Para maiores de 16 anos, a frequência de discotecas e similares

No entanto, o Governo aprovou em Conselho de Ministros a 14/10/2021, o aumento da classificação etária das touradas para “maiores de 16 anos”, assumindo que este tipo de espetáculo não é aconselhável a crianças e é prejudicial para as mesmas por incluir cenas de violência real. A nova classificação aguarda há meses a promulgação pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

Esta classificação do Estado português, que reconhece a violência das touradas, deve ser respeitada pelos pais, a quem compete a responsabilidade de decidir.

A classificação atual encontra-se desajustada, desprotegendo a faixa etária mais vulnerável, ou seja as crianças entre os 3 e os 12 anos, que podem ser expostas a este tipo de violência. Só as crianças menores de 3 anos estão expressamente impedidas de assistir a um espetáculo tauromáquico, embora esta determinação não seja cumprida.

A classificação etária só se aplica nos espetáculos tauromáquicos licenciados pela Inspeção Geral das Atividades Culturais (IGAC), pelo que não inclui as largadas de touros, demonstrações de toureio, festas camperas e outros eventos ilegais que são amplamente promovidos e aos quais assistem crianças de todas as idades, que testemunham acidentes muito graves com feridos e mortos.

Conclusão: As touradas estão classificadas para maiores de 12 anos. Os pais devem respeitar a classificação etária incluída na legislação evitando que as crianças e jovens sejam expostos a este tipo de violência. Crianças com menos de 3 anos não podem assistir a touradas, mesmo que estejam acompanhados por um adulto.

As crianças podem participar em touradas?

A Lei n.º 31/2015, de 23 de abril, que “estabelece o regime de acesso e exercício da atividade de artista tauromáquico e de auxiliar de espetáculo tauromáquico”, determina que “Os artistas tauromáquicos e os auxiliares devem ter a idade mínima de 16 anos” (nº 3 do artigo 3º). Incompreensivelmente esta lei abre uma exceção para as categorias “amadoras” e para os “forcados”, remetendo a participação de crianças nestas categorias para uma autorização especial da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ) o que colide com o que está expresso no Código do Trabalho e com os mais elementares princípios de salvaguarda do superior interesse da criança. O Estado não pode prever uma autorização especial para que as crianças coloquem a sua vida em risco, principalmente na categoria mais perigosa de todas, a de “forcados”.

A Lei nº 105/2009 de 14 de setembro, que regulamenta o Código do Trabalho, prevê especialmente que os menores de 16 anos não podem participar em espetáculo que envolva contacto com animal, substância ou atividade perigosa que possa constituir risco para a segurança ou a saúde do menor. (nº 2 do Artigo 2º).

A mesma lei, que tem sido mal interpretada, estabelece que Sem prejuízo do previsto no número anterior, o menor só pode participar em espetáculos que envolvam animais desde que tenha pelo menos 12 anos e a sua atividade, incluindo os respetivos ensaios, decorra sob a vigilância de um dos progenitores, representante legal ou irmão maior” (nº 3 do citado artigo). Esta situação não pode ser aplicada à tauromaquia, porque é consensual que nos espetáculos tauromáquicos, os artistas enfrentam animais que constituem risco para a sua saúde e segurança, facto que dá origem a acidentes muito graves com feridos e até mortes.

Ainda de acordo com o Código do Trabalho, a violação destas regras constitui uma contraordenação muito grave, imputável à entidade promotora da atividade, podendo ser aplicada a sanção acessória da publicidade da condenação e ainda, tendo em conta os efeitos gravosos para o menor ou o benefício económico retirado pela entidade promotora, um conjunto de cominações específicas que englobam a interdição do exercício de profissão, a privação do direito a subsídio ou benefício outorgado por entidade pública e o encerramento de estabelecimento cujo funcionamento depende de autorização ou licença.

Neste sentido, é claro que só podem participar em espetáculos tauromáquicos os maiores de 16 anos, embora isso continue a acontecer em eventos ilegais que não são autorizados pela Inspeção Geral das Atividades Culturais (IGAC), tais como “Demonstrações de toureio“, “Aulas Práticas de Toureio“, “Garraiadas“, “Festas Camperas“, “largadas“, entre outros. Nestes eventos participam crianças de todas as idades de escolas de toureio e grupos de forcados juvenis e infantis, sendo frequente a inclusão na publicidade de uma advertência alertando que “a organização não se responsabiliza por qualquer tipo de acidente“.

Conclusão: As crianças menores de 16 anos não podem participar em touradas e outros eventos tauromáquicos. A participação de crianças com menos de 16 anos em eventos tauromáquicos é considerada uma contraordenação muito grave.

As crianças podem assistir ou participar em largadas de touros?

Em Portugal, ao contrário do que acontece em Espanha, não existe qualquer tipo de regulamentação para as largadas de touros e outro tipo de festejos taurinos populares. O regulamento do espetáculo tauromáquico abrange apenas as corridas de toiros; corridas mistas; novilhadas; novilhadas populares; variedades taurinas e os festivais tauromáquicos realizados em praças de touros fixas ou em praças desmontáveis.

Apesar de não existir nenhum limite de idade para assistir e participar em largadas de touros, a Lei nº 105/2009 de 14 de setembro (que regulamenta e altera o Código do Trabalho) determina no nº 1 do artigo 2º (Atividades permitidas a menor) que “o menor pode participar em espetáculo ou outra atividade de natureza cultural, artística ou publicitária, designadamente como ator, cantor, dançarino, figurante, músico, modelo ou manequim”.

A mesma Lei prevê ainda que “a situação prevista no número anterior não pode envolver contacto com animal, substância ou atividade perigosa que possa constituir risco para a segurança ou a saúde do menor” (nº 2 do Artigo 2º).

Neste sentido, a participação de menores de 16 anos em largadas, por colocar claramente em risco a segurança das crianças e jovens, deve ser considerada interdita a estas idades, salvaguardando a sua saúde e segurança.

Conclusão: Em Portugal, as largadas de touros não estão regulamentadas, pelo que não existe uma classificação etária para este tipo de atividade, apesar dela ser extremamente perigosa e sujeita a múltiplos acidentes, incluindo acidentes mortais. A assistência e a participação de crianças e jovens em largadas de touros deve ser evitada de forma a proteger os menores de idade da violência inerente a este tipo de atividade.

As escolas de toureio

Em Portugal, tal como em Espanha, existem algumas “escolas de toureio” onde as crianças são ensinadas a tourear. No caso português, estas “escolas” destinam-se a formar matadores de touros e praticam o chamada “toureio a pé”.

Em 2023 existiam 5 “escolas de toureio” em funcionamento:

  1. Escola de Toureio José Falcão – Vila Franca de Xira
  2. Escola de Toureio e Tauromaquia da Moita
  3. Escola Taurina do Montijo
  4. Escola de toureio de Azambuja
  5. Escola de toureio da ARCAS –  Samora Correia

Apesar de se designarem “escolas”, tratam-se de associações culturais que são apoiadas pelas Câmaras Municipais, que cedem as instalações para a realização de aulas práticas e subsídios financeiros para suportar as despesas.

Ao contrário de Espanha, não existe qualquer legislação em Portugal para regular o funcionamento das “escolas de toureio” nem qualquer limite de idade para o ingresso das crianças.

Eventos para crianças de escolas de toureio.
Cartazes de eventos tauromáquicos ilegais (não licenciados pela IGAC) com a participação de crianças em Portugal.
Criança a tourear no CNEMA em Santarém.
Criança a tourear no CNEMA em Santarém. ©Basta de Touradas
acidente com criança em tourada
Criança colhida na arena do Campo Pequeno. ©Basta de Touradas
As crianças e a tauromaquia
Criança exposta ao perigo e à violência na Praça de touros da Moita.
Acidente com criança em tourada
Acidente com criança em tourada em Portugal.
Crianças em touradas
Crianças de escola de toureio numa tourada em Lisboa.

Campanha Infância Sem Violência

Campanha contra a exposição de crianças à violência da tauromaquia.

As crianças e a tourada

O dever da proteção social.
Dra. Constança Carvalho

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