Basta de Touradas quer apurar responsabilidades na morte de 2 forcados e nas transgressões crónicas nas touradas

Médico cirurgião denuncia falta de condições nas praças de touros como a principal causa da morte dos artistas tauromáquicos

Plataforma denuncia irregularidades graves e falta de fiscalização isenta e eficaz nos espetáculos tauromáquicos

Basta de Touradas pede fiscalização rigorosa das condições das praças de touros em Portugal

Crueldade e violência numa pega de forcados numa tourada em Portugal.
Acidente com grupo de forcados (foto: Plataforma Basta de Touradas – D.R.)

Lisboa, 12 de outubro de 2017

A Plataforma Basta de Touradas solicitou, no passado dia 22 de setembro, esclarecimentos à Inspeção Geral das Atividades Culturais (IGAC) acerca dos incidentes graves ocorridos nas praças de touros da Moita e Cuba que resultaram na morte de dois forcados (Pedro Primo e Fernando Reynolds Quintela), pedindo igualmente ao Ministro da Cultura que sejam apuradas responsabilidades.

De acordo com as declarações de um ex-forcado e médico cirurgião, difundidas por diversos órgãos de comunicação tauromáquica (ver anexos), os referidos incidentes resultaram de falhas graves ao nível da segurança dos recintos, o que reforça a ideia de que não existe uma fiscalização competente do cumprimento da legislação nacional em matéria de espetáculos tauromáquicos.

António Peças, ex-forcado e médico cirurgião, denuncia “as condições (in)existentes nas enfermarias da quase totalidade das nossas praças de touros”. Tendo em conta estas declarações públicas e considerando o artigo 20º do Regulamento do Espetáculo Tauromáquico (adiante designado por RET) que refere expressamente que a “inobservância das exigências previstas para o posto de socorros e assistência médica” é uma das condições para o impedimento do espetáculo, consideramos muito grave o cenário em que ocorreram estas mortes e exigimos uma urgente e isenta fiscalização das praças de touros existentes no país.

Existência de seguro de acidentes é condição essencial para a realização de uma tourada

A falta de condições nestes recintos, e a falta de uma inspeção isenta e eficaz, têm dado origem a situações muito graves também ao nível do bem-estar animal, nomeadamente com a morte de animais nos curros, nos veículos de transporte e na arena das praças, e a lide de touros com lesões graves (membros e hastes partidas, cegueira, etc.) contrariando o que está estipulado na legislação.

Ao longo da temporada que agora termina, a plataforma Basta de Touradas registou inúmeras violações da lei em touradas realizadas em todo o país, que em alguns casos deveriam ter levado ao imediato cancelamento do espetáculo.

Infelizmente os Delegados Técnicos Tauromáquicos (pessoas com fortes ligações ao meio tauromáquico), que têm a obrigação de fiscalizar e fazer cumprir a lei nestes eventos, não atuaram conforme está determinado na lei, nomeadamente no cumprimento do Decreto-Lei n.º 89/2014 de 11 de junho.

A Plataforma Basta de Touradas tem manifestado nos últimos anos a sua preocupação junto da IGAC e da DGAV (Direção Geral de Agricultura e Veterinária), devido às constantes violações da lei e à falta de condições para a realização de espetáculos tauromáquicos em recintos que não cumprem com as normas de segurança e de bem-estar dos animais ao nível do transporte,  alojamento, arranque dos ferros e abate.

Não é a primeira vez que são denunciadas as condições degradantes da maioria das praças de touros, e a falta de condições das enfermarias.

Em 2015, ao Jornal “Mirante” o médico cirurgião Luís Miguel Ramos alertava para esta grave falha, referindo que “As praças de toiros em Portugal são obrigadas por lei a terem enfermarias mas a maioria não está em condições de proporcionar um bom socorro aos artistas da festa em caso de necessidade”.

Apesar das denuncias à violação da lei e o risco da falta de condições, a IGAC continuou a licenciar os recintos para a realização de espetáculos.

De acordo com a legislação em vigor, é da responsabilidade da IGAC a fiscalização e o controlo do funcionamento dos recintos bem como o cumprimento do disposto no RET (artigo 4º, nº 1) competindo-lhe especificamente a inspeção das condições técnicas, sanitárias e de segurança das praças de touros fixas.

Neste sentido, a plataforma Basta de Touradas, e na sequência destes dois graves incidentes, solicitou à IGAC esclarecimentos sobre as circunstâncias em que decorreram estes dois espetáculos, nomeadamente:

  • A qualificação dos médicos e enfermeiros designados para os espetáculos em questão, com vista a apurar se os mesmos cumpriam com os requisitos das tabelas anexas ao RET, e estavam na posse do equipamento também ali exigido;
  • Os pareceres da equipa médica entregues ao Diretor de Corrida, e se foram atestados o cumprimento das exigências previstas no RET para os postos de socorro e assistência médica, assim como os registos das ocorrências entregues pelos Diretores de Corrida à IGAC;
  • O relatório anual da inspeção periódica às praças de touros de Cuba e da Moita, com vista a apurar se os postos de socorro cumprem com os requisitos impostos no artigo 15º do RET;

Questiona ainda a plataforma se os promotores dos espetáculos (Rafael Vinhas Unipessoal Lda. e Bombeiros Voluntários de Cuba) comunicaram, conforme era sua obrigação, ao hospital mais próximo com serviço de urgência polivalente ou médico-cirúrgica, bem como à Delegação Regional do Instituto Nacional de Emergência Médica, I.P., com a antecedência mínima de 5 dias dias úteis relativamente ao dia da realização do espetáculo, assim como se entregou à equipa médica e ao Diretor de Corrida, até à hora do sorteio das reses, o documento comprovativo da referida comunicação.

A Basta de Touradas pretende ainda saber se os promotores, na comunicação prévia dos espetáculos dirigida à IGAC, instruíram nos seus pedidos as cópias das apólices de seguros de acidentes pessoais dos “artistas” Pedro Primo e Fernando Reynolds Quintela.

A plataforma Basta de Touradas aguarda a resposta da IGAC às solicitações requeridas bem como às dezenas de denúncias relacionadas com constantes violações da legislação em vigor, exigindo que a atividade tauromáquica deixe de ser fiscalizada por pessoas ligadas ao meio e passe a ser fiscalizada por técnicos isentos que possam garantir o cumprimento efetivo da lei.

É incompreensível que a morte de 2 jovens tenha passado impune e sem qualquer tipo de consequências, como se a morte na arena fosse um acontecimento natural. Em 1880 foi decretada em Portugal a proibição da realização de pegas devido à morte, precisamente, de dois forcados numa tourada na antiga praça de touros do Campo Santana em Lisboa. 137 anos depois, a situação é encarada com naturalidade e continua tudo na mesma, à espera de uma nova tragédia.

Anexos:

Plataforma Basta de Touradas.

Anexos:

Declarações do médico cirurgião António Peças (19-9-2017):
http://www.taurodromo.com/noticia/2017-setembro/13307-antonio-pecas-o-cirurgiao-e-exforcado-fala-sobre-as-condicoes-do-suporte-medico-nas-pracas
Declarações do médico cirurgião Luís Miguel Ramos (1-7-2015)
https://omirante.pt/entrevista/2015-07-01-enfermarias-das-pracas-de-toiros-sao-uma-zona-cinzenta-da-festa-2